Fora do Mundo
Notas & Apontamentos. [Pedro Lomba, Pedro Mexia e Francisco José Viegas] foradomundo@oninet.pt
8/17/2005
Agosto '05
He took a cab to the shopping malls
Bought and ate till he could do neither any more
Then found love on Channel 44
(Blur, «Magic America», Parklife, 1994). [P.M.]
8/16/2005
Não uses isto
Já não é a primeira vez. Alguém conta uma história e depois olha para mim e pede seriamente: «não uses isto». Fico sempre um bocado perplexo, porque nunca divulguei segredos ou conversas alheias de cunho privado. Nem no blogue nem em lado nenhum.
Mas admito que encaro tudo o que me chega como «material» em potência. O mundo é um manancial inexaurível de frases e episódios. Mas existem regras claras: nomeadamente que as pessoas mencionadas nunca sejam identificáveis. Depois, recupero histórias que me contaram há anos e anos, mudo o sexo das personagens, pego em bocados e detalhes que me interessam, corto e colo a meu interesse. E uso aspas sempre que possível, mas umas aspas abstractas, que servem apenas para não me locupletar com achados alheios.
Nesse sentido, é verdade, uso tudo. Mas não revelo nada. [P.M.]
Porno
A palavra mais procurada pelos portugueses no Google é «sexo». Somos umas mentes pornográficas? Não especialmente. É assim em todo o lado. Estranho é que entre as dez palavras que os portugueses mais solicitam está «DGCI». Direcção-Geral de Contribuições e Impostos. Isso sim é uma coisa realmente pornográfica. [P.M.]
8/15/2005
Condomínio
A minha vizinha do 2º esquerdo faz hoje anos (prestimosa indicação do jornal Público). [P.M.]
8/14/2005
Imaginário
Augusto M. Seabra escreveu recentemente que a música clássica «não faz parte» do meu «imaginário». É uma formulação certíssima. Geralmente as pessoas que me conhecem dizem uma coisa que me encanita: que eu «não gosto de música clássica». Apenas porque tenho pouquíssimos discos e nunca faço referência a compositores e sinfonias. Mas é uma asserção errónea. É verdade que sou bastante inculto em termos de música erudita. É verdade que nunca escrevi nada sobre Rachmaninov. Esvrever sobre música é sempre difícil. Se escrevo sobre música pop é porque a música pop é visceral, imediata, do it yourself. E tem as letras, que ajudam ao discurso. Não possuindo noções musicais, não conseguiria escrevinhar nada sobre Bach que não vogasse na zona xaroposa do «sublime» e do «inexprimível». Assim, não escrevo nada. O que não significa que menospreze a música erudita. Acontece que a música pop faz realmente parte do meu imaginário, está directamente ligada a memórias e momentos, mesmo porque se tratou de uma descoberta tardia. Na música erudita isso só me acontece com Schubert. Se sou um tão fervoroso fanático de música pop, é porque faço minhas as palavras de Lou Reed: my life was saved by rock n’ roll. No sentido mais literal que possam imaginar. [P.M.]
8/13/2005
Quote 2
Sobre o mítico Galeto, no guia Lonely Planet dedicado a Portugal: A Lisbon institution, preserved in a time capsule since 1968 (…) Staff members are pensioned-off Woody Allen extras. (…) Tall pyramids of fruit are just asking to be knocked down. [P.M.]
Quote 1
Sobre um disco de Serge Gainsbourg, no Rolling Stone Album Guide: «lush, witty, campy, and throbbing with the kind of irresistible erotic charisma that only truly ugly people can pull off» (o sublinhado é obviamente meu). [P.M.]
Alô Estocolmo
Imagino que todos tenham levado para férias o segundo romance de José António Saraiva. Afinal, o homem teve uma publicidade danada no seu próprio jornal, incluindo recensão elogiosa e uma entrevista memorável, a que O Independente chamou, com exactidão terminológica, «o maior alfinete de dama» da imprensa portuguesa.
Saraiva, lembremos, é o segundo ficcionista da família, depois do seu tio José Hermano. Curiosamente, a apresentação do romance ficou também a cargo dos parentes, neste caso da mãe do autor. A mãezinha foi imparcial e comparou o José ao Herculano. Eu acho que isso não é uma opinião imparcial, mas enfim. Só quem se esqueceu das estopadas dos Euricos e Hermengardas acha que a menção a Herculano é um elogio. Mas enfim, a comparação com Joyce soaria certamente excessiva.
Saraiva, na entrevista citada, diz que pensa ganhar o Nobel da Literatura. Tem sido muito gozado por causa dessa frase. Mas convenhamos: os suecos são capazes de tudo. E até já vimos piorzinho.
Jardim Colonial é um decalque de situações conhecidas do mundo dos media, e nisso não aquenta nem arrefenta. O mais surpreendente é o modo como o inibido Saraiva trata a temática sexual. Há mesmo uma cena de sexo numa cubata, prova que Saraiva conhece as questões levantadas pelos «gender studies» e pelos estudos pós-coloniais, sendo que os funde num único episódio, aliás rematado com notável lirismo: «Nélson passou um braço por cima dos ombros de Filomena, aconchegou-a, e com a outra mão começou a fazer-lhe festas nas pernas, primeiro em baixo e depois cada vez mais acima até lhe tocar com as pontas dos dedos nas virilhas. Ela não se mexia: parecia paralisada. Ele meteu-lhe os dedos por baixo das cuecas, sentiu [atenção Academia Sueca] uma camada de pêlo duro e encaracolado, ficou com as borbulhas do sangue a escaldar, quis ir mais fundo» (pág. 137). Também eu queria muita coisa.
Depois, a páginas 189, há um momento inolvidável:«Óscar largou o Diário de Notícias e abriu o caderno de emprego do Expresso. «Não há dúvida de que o Expresso é um bom jornal – pensou – mas não é nada cómodo; estas páginas enormes cheias de anúncios não dão jeito nenhum». Isto, meus amigos, é ficção e da boa. Só na ficção, e na ficção mais genial, é que alguém acha o Expresso um bom jornal. [P.M.]
8/11/2005
Dentro
O homem que eu mais admiro? O anatomista italiano Gabriel Fallopius. Mais nenhum homem passou à posteridade dentro das mulheres. [P.M.]
Avião
Oliver Stone está a fazer um filme sobre o 11 de Setembro. Temo que venha a ser o terceiro avião. [P.M.]
Depois do jogo
A meio de uma insuportável reunião de intelectuais penso com os meus botões: «pernósticos só depois do jogo». [P.M.]
Ronnie on drums
Leio algumas compilações de crítica de rock dos anos 1977-1990. Espreito o índice onomástico para perceber quais as bandas mais citadas e portanto mais importantes. Não há duvida: «Margaret Thatcher» e «Ronald Reagan». [P.M.]
The E word
Recentemente, estive numa mesa redonda numa universidade. Nas intervenções dos alunos, percebi que para os actuais alunos universitários não há palavras mais insultuosas que «elite» e «elitismo». [P.M.]
1976 (2)
Por outro lado, as virgens acabaram com a Constituição de 1976 (embora eu só tenha percebido isso por volta de 1994). [P.M.]
Perder
A última virgem que J. conhecia deixou de ser virgem. J. está um bocado triste. Um traço católico? É possível. O certo é que dizemos todos «perder a virgindade», e perder tem evidentemente um cunho triste. [P.M.]
8/08/2005
28 to go
B fez sessenta anos e disse a um amigo (que me contou a mim): «Nunca me senti tão bem. Praticamente não penso em sexo. Não imaginas o alívio. Sou pela primeira vez um homem livre». [P.M.]
Contradictio
Li pela primeira vez a expressão «sexual love» na obra de um filosófo inglês (Roger Scruton, salvo erro). Pensei que fosse gralha. [P.M.]
Yuck
There's no love just fuck fuck fuck. Uma vez citei esta frase meio punk mas que na verdade é de Samuel Beckett. No texto, apareceu a seguinte gralha There's no love just luck luck luck. [P.M.]
A imprensa
Um insulto custa um bocado. Dez insultos custa um bocado. Cem insultos não custa nada. [P.M.]
Ao vivo
Não aprecio sexo ao vivo. Não admira: as únicas vezes que vi sexo ao vivo, o sexo era comigo. [P.M.]
8/04/2005
Next
Ouço The Cure: «M. (álbum Seventeen Seconds , 1980). E tenho um sobressalto com o final da letra : Take a step / You move in time / But it's always back / The reasons are clear/ Your face is drawn/ And ready for the next attack. É uma canção de tema pessoal. Mas o último verso («ready for the next attack») fez-me imensa impressão. É essa a nossa situação em 2005: prontos para o próximo ataque. [P.M.]