8/17/2005












O Fora do Mundo acaba aqui. A todos os que neste ano e meio nos leram, linkaram, comentaram e escreveram, muito obrigado.

Francisco José Viegas

Pedro Lomba
Pedro Mexia

Agosto '05

He took a cab to the shopping malls
Bought and ate till he could do neither any more
Then found love on Channel 44


(Blur, «Magic America», Parklife, 1994). [P.M.]

8/16/2005

Não uses isto

Já não é a primeira vez. Alguém conta uma história e depois olha para mim e pede seriamente: «não uses isto». Fico sempre um bocado perplexo, porque nunca divulguei segredos ou conversas alheias de cunho privado. Nem no blogue nem em lado nenhum.

Mas admito que encaro tudo o que me chega como «material» em potência. O mundo é um manancial inexaurível de frases e episódios. Mas existem regras claras: nomeadamente que as pessoas mencionadas nunca sejam identificáveis. Depois, recupero histórias que me contaram há anos e anos, mudo o sexo das personagens, pego em bocados e detalhes que me interessam, corto e colo a meu interesse. E uso aspas sempre que possível, mas umas aspas abstractas, que servem apenas para não me locupletar com achados alheios.

Nesse sentido, é verdade, uso tudo. Mas não revelo nada. [P.M.]

Porno

A palavra mais procurada pelos portugueses no Google é «sexo». Somos umas mentes pornográficas? Não especialmente. É assim em todo o lado. Estranho é que entre as dez palavras que os portugueses mais solicitam está «DGCI». Direcção-Geral de Contribuições e Impostos. Isso sim é uma coisa realmente pornográfica. [P.M.]

8/15/2005

Condomínio



A minha vizinha do 2º esquerdo faz hoje anos (prestimosa indicação do jornal Público). [P.M.]

Bairrismo

Os U2 elogiaram o hospital da minha rua. [P.M.]

8/14/2005

Imaginário

Augusto M. Seabra escreveu recentemente que a música clássica «não faz parte» do meu «imaginário». É uma formulação certíssima. Geralmente as pessoas que me conhecem dizem uma coisa que me encanita: que eu «não gosto de música clássica». Apenas porque tenho pouquíssimos discos e nunca faço referência a compositores e sinfonias. Mas é uma asserção errónea. É verdade que sou bastante inculto em termos de música erudita. É verdade que nunca escrevi nada sobre Rachmaninov. Esvrever sobre música é sempre difícil. Se escrevo sobre música pop é porque a música pop é visceral, imediata, do it yourself. E tem as letras, que ajudam ao discurso. Não possuindo noções musicais, não conseguiria escrevinhar nada sobre Bach que não vogasse na zona xaroposa do «sublime» e do «inexprimível». Assim, não escrevo nada. O que não significa que menospreze a música erudita. Acontece que a música pop faz realmente parte do meu imaginário, está directamente ligada a memórias e momentos, mesmo porque se tratou de uma descoberta tardia. Na música erudita isso só me acontece com Schubert. Se sou um tão fervoroso fanático de música pop, é porque faço minhas as palavras de Lou Reed: my life was saved by rock n’ roll. No sentido mais literal que possam imaginar. [P.M.]

Balzac



Emmanuelle Béart, nascida a 14 de Agosto de 1965. [P.M.]

8/13/2005

Quote 2

Sobre o mítico Galeto, no guia Lonely Planet dedicado a Portugal: A Lisbon institution, preserved in a time capsule since 1968 (…) Staff members are pensioned-off Woody Allen extras. (…) Tall pyramids of fruit are just asking to be knocked down. [P.M.]

Quote 1

Sobre um disco de Serge Gainsbourg, no Rolling Stone Album Guide: «lush, witty, campy, and throbbing with the kind of irresistible erotic charisma that only truly ugly people can pull off» (o sublinhado é obviamente meu). [P.M.]

Alô Estocolmo

Imagino que todos tenham levado para férias o segundo romance de José António Saraiva. Afinal, o homem teve uma publicidade danada no seu próprio jornal, incluindo recensão elogiosa e uma entrevista memorável, a que O Independente chamou, com exactidão terminológica, «o maior alfinete de dama» da imprensa portuguesa.

Saraiva, lembremos, é o segundo ficcionista da família, depois do seu tio José Hermano. Curiosamente, a apresentação do romance ficou também a cargo dos parentes, neste caso da mãe do autor. A mãezinha foi imparcial e comparou o José ao Herculano. Eu acho que isso não é uma opinião imparcial, mas enfim. Só quem se esqueceu das estopadas dos Euricos e Hermengardas acha que a menção a Herculano é um elogio. Mas enfim, a comparação com Joyce soaria certamente excessiva.

Saraiva, na entrevista citada, diz que pensa ganhar o Nobel da Literatura. Tem sido muito gozado por causa dessa frase. Mas convenhamos: os suecos são capazes de tudo. E até já vimos piorzinho.

Jardim Colonial é um decalque de situações conhecidas do mundo dos media, e nisso não aquenta nem arrefenta. O mais surpreendente é o modo como o inibido Saraiva trata a temática sexual. Há mesmo uma cena de sexo numa cubata, prova que Saraiva conhece as questões levantadas pelos «gender studies» e pelos estudos pós-coloniais, sendo que os funde num único episódio, aliás rematado com notável lirismo: «Nélson passou um braço por cima dos ombros de Filomena, aconchegou-a, e com a outra mão começou a fazer-lhe festas nas pernas, primeiro em baixo e depois cada vez mais acima até lhe tocar com as pontas dos dedos nas virilhas. Ela não se mexia: parecia paralisada. Ele meteu-lhe os dedos por baixo das cuecas, sentiu [atenção Academia Sueca] uma camada de pêlo duro e encaracolado, ficou com as borbulhas do sangue a escaldar, quis ir mais fundo» (pág. 137). Também eu queria muita coisa.

Depois, a páginas 189, há um momento inolvidável:«Óscar largou o Diário de Notícias e abriu o caderno de emprego do Expresso. «Não há dúvida de que o Expresso é um bom jornal – pensou – mas não é nada cómodo; estas páginas enormes cheias de anúncios não dão jeito nenhum». Isto, meus amigos, é ficção e da boa. Só na ficção, e na ficção mais genial, é que alguém acha o Expresso um bom jornal. [P.M.]

8/11/2005

Curb your enthusiasm



Não escondo o meu entusiasmo. [P.M.]

Dentro

O homem que eu mais admiro? O anatomista italiano Gabriel Fallopius. Mais nenhum homem passou à posteridade dentro das mulheres. [P.M.]

Avião

Oliver Stone está a fazer um filme sobre o 11 de Setembro. Temo que venha a ser o terceiro avião. [P.M.]

Depois do jogo

A meio de uma insuportável reunião de intelectuais penso com os meus botões: «pernósticos só depois do jogo». [P.M.]

Ronnie on drums

Leio algumas compilações de crítica de rock dos anos 1977-1990. Espreito o índice onomástico para perceber quais as bandas mais citadas e portanto mais importantes. Não há duvida: «Margaret Thatcher» e «Ronald Reagan». [P.M.]

The E word

Recentemente, estive numa mesa redonda numa universidade. Nas intervenções dos alunos, percebi que para os actuais alunos universitários não há palavras mais insultuosas que «elite» e «elitismo». [P.M.]

1976 (2)

Por outro lado, as virgens acabaram com a Constituição de 1976 (embora eu só tenha percebido isso por volta de 1994). [P.M.]

Perder

A última virgem que J. conhecia deixou de ser virgem. J. está um bocado triste. Um traço católico? É possível. O certo é que dizemos todos «perder a virgindade», e perder tem evidentemente um cunho triste. [P.M.]

High as kite (2)

Ela está tão feliz que a pele dela se ouve à distância. [P.M.]

High as kite (1)

Ela está tão feliz que até cita poetas felizes. [P.M.]

1976

N. diz que as raparigas melhoraram com a Constituição de 76. [P.M.]

8/08/2005

Budismo

O contrário do budismo é a erecção. [P.M.]

28 to go

B fez sessenta anos e disse a um amigo (que me contou a mim): «Nunca me senti tão bem. Praticamente não penso em sexo. Não imaginas o alívio. Sou pela primeira vez um homem livre». [P.M.]

Contradictio

Li pela primeira vez a expressão «sexual love» na obra de um filosófo inglês (Roger Scruton, salvo erro). Pensei que fosse gralha. [P.M.]

Gender studies

Dizemos «não faz o meu género». Mas não dizemos «não faz o meu sexo». [P.M.]

Tempo

As mulheres tem relógio biológico. Os homens têm cronómetro fisiológico. [P.M.]

Nós (The Night of the Hunter)

LOVE numa das mãos. HATE na outra. Mas com menos bom aspecto. [P.M.]

De um sms

em agosto está toda a gente fodida ou a foder [P.M.]

Yuck

There's no love just fuck fuck fuck. Uma vez citei esta frase meio punk mas que na verdade é de Samuel Beckett. No texto, apareceu a seguinte gralha There's no love just luck luck luck. [P.M.]

Can't buy me love

Mas para leasing dá. [P.M.]

As coisas

Em semanas assim, a salvação consiste na propriedade privada. [P.M.]

Simão do Deserto

Como um eremita que se achasse demasiado sociável. [P.M.]

A imprensa

Um insulto custa um bocado. Dez insultos custa um bocado. Cem insultos não custa nada. [P.M.]

Ao vivo

Não aprecio sexo ao vivo. Não admira: as únicas vezes que vi sexo ao vivo, o sexo era comigo. [P.M.]

A primeira vez

A primeira vez que me telefonaram para o telemóvel era engano. [P.M.]

Party of five

a.k.a. «jogar em casa». [P.M.]

8/04/2005

Fatso



Qualquer pessoa pode ser uma estrela de rock. Thanks, Frank. [P.M.]

Mersault

O calor faz de mim um Mersault. [P.M.]

Next

Ouço The Cure: «M. (álbum Seventeen Seconds , 1980). E tenho um sobressalto com o final da letra : Take a step / You move in time / But it's always back / The reasons are clear/ Your face is drawn/ And ready for the next attack. É uma canção de tema pessoal. Mas o último verso («ready for the next attack») fez-me imensa impressão. É essa a nossa situação em 2005: prontos para o próximo ataque. [P.M.]

Modernos

Somos modernos. Usamos com orgulho palavras como «moderno» e «modernidade». Mas Drummond de Andrade lembrou que somos apenas «modernos provisórios». [P.M.]

Sociedade

O punk é obviamente esquerdista (tendência anarquista). No entanto, Johnny Ramone era assumidamente de direita. E a conservadora Margaret Thatcher cunhou um grande slogan punk: there is no such thing as a society. [P.M.]

7/28/2005

Feisty (2)

A inveja é, com efeito, uma coisa feia. E foi precisamente a fealdade da inveja de (eu também) não ter conseguido bilhete para o concerto da menina, em Lisboa, que levou a que tivesse de fazer uma cansativa viagem ao Porto, Hard Club, mais precisamente Cais de Gaia.

Curiosamente o Hard Club estava praticamente vazio, o que facilitou que estivesse tão perto que conseguia ver as cordas mexer. Foi um concerto devidamente intimista, com muitos esquecimentos de letras, muitas interrupções do género "Will that guy shut the hell up?", o pouco profissionalismo fashion, muitos agradecimentos e muitas histórias. Ficámos todos a saber que a Feist conheceu o Erland Oye (Kings of Convenience) num festival de música electrónica em 2003, Lisboa, onde ambos faziam de DJ's, quando nunca suspeitariam que, na realidade, ambos eram cantautores de música calmo-quietinha. Neste tema, porém, nunca esperei ouvir tanta guitarra distorcida desta menina canadiana. Não raras vezes aparecia ali uma atitude muito punk rock, se bem que sempre irónica.

O album foi praticamente todo tocado, acrescido de um punhado de novas canções, segundo Feist, duas delas escritas naquela manhã a olhar para o Douro. Uma delas é bastante boa e o refrão é qualquer coisa como "Before you marry him, go see where he lays...". Fiquem atentos. O último encore contou com uma versão de "Build up" dos Kings of Convenience e terminou com uma extensíssima "Let it die (and get out of my mind)", seguida de uma juvenil vénia, beijinhos e "Now go home with this lullaby i played you". E eu fui, mas Lisboa ainda era longe.

(Pedro Moniz Lopes)

7/27/2005

Razões para escrever posts em Agosto

Ninguém lê blogues em Agosto. [P.M.]

As iniciais

Uso muito as iniciais, por influência dos diaristas que leio. Mas penso sempre no comentário de Woody Allen: Should I marry W.? Not if she won't tell me the other letters in her name.

(citação lembrada aqui) [P.M.]

A cara que mereces

B. desabafa: «é terrível, porque não estou nada bem mas estou com cara de quem está bem». [P.M.]

Alienação

Não sou mesmo nada marxista. Sempre que experimentei alguma «alienação», achei óptimo. [P.M.]

A bela estação

7/26/2005

Confesso:

(este post foi retirado pelo autor) [P.M.]

Crimes de guerra

Uma espécie de napalm dos sentimentos. [P.M.]

Tour

Cristo mostrou as feridas ao incrédulo Tomé. Mas não andou em digressão com as suas feridas, nem cobrou bilhetes a quem lhes quisesse tocar. [P.M.]

Summer in the city

N. diz «já é verão» como um caçador a empanturrar-se de cartuchos antes duma batida. [P.M.]

Single

Eram tão musicais e metafóricos que discutiam a problemática do CD single. [P.M.]

Caderno de emprego

Os jornalistas do Público ignoram a minha profissão. O que é normal, visto que não tenho nenhuma.

Hoje, pela segunda vez em pouco tempo, sou apresentado como «publicista». Assim mesmo.

Como expliquei há uns meses, até gosto do aspecto démodé dessa designação. Mas começo a receber mensagens de gozo.

Assim, na próxima vez que o Público me pedir um depoimento sobre os destinos de a nação, vou indicar como ocupação: scout da Elite.

Pode ser que pegue. [P.M.]

7/25/2005

Le big MEC



N. 25 de Julho de 1955. A malta agradece. [P.M.]

Cabala

Escrevo posts cabalísticos porque gostava de congeminar uma cabala. [P.M.]

Cláudia

Cláudia era tão mas tão feminista que chamava ao discman discperson. [P.M.]

7/24/2005

Feisty



A inveja é uma coisa feia, excepto quando não se conseguiu arranjar bilhete para o concerto desta senhora. A nossa página está aberta a textos sobre os concertos portugueses de Feist. [P.M.]

7/23/2005

Público & privado

Alguns bloguistas dizem que só os blogues individuais é que funcionam. Admito que sim. Mas mais que os problemas de um blogue colectivo, preocupam-me os problemas dos blogues mistos. Ou seja: os que misturam temas públicos e privados. Escrevo um post sobre Chirac e acham que é uma charada sobre a menina Rita. Escrevo um post sobre a menina Rita e acham que é uma charada sobre Chirac. Assim não dá. [P.M.]

A discussão entre as direitas tem naturalmente interesse (mesmo porque com o fim do Barnabé a malta está meio desempregada). Mas essa discussão tem interesse quando mobiliza as várias tradições e confronta diversos «issues». E não (como tenho visto), quando degenera em sectarismos e atestados de impureza ideológica.

Se uma pessoa se define como comunista, socialista, liberal, conservadora, etc, essa é a sua definição política. Claro que há equívocos e minudências semânticas, mas (...) [este post passou para A Mão Invisível]

7/22/2005

Bibliografia passiva

«O coiso escreveu um belo coiso sobre isso». [P.M.]

T-shirt 2005

He can rhyme, but can he fuck? [P.M.]

Esse

«Li aquele post em que me mencionavas».
«Que post?»
«Aquele em que ostensivamente não me mencionavas».
«Ah, esse». [P.M.]

Engate 2005

«Ah, mas eu sou amigo dos gajos do Gato Fedorento». [P.M.]

Post

«Como se diz em inglês pós qualquer coisa?»
«Post». [P.M.]

As vestes

Não vou rasgar as vestes. Não aprecio o nudismo. [P.M.]

Cervantes

Justificar cada «triste figura» como homenagem a Cervantes. [P.M.]

What the doctor said

Sempre que sentir ataques de aforismos, tome dois destes, deite-se um bocado e beba muita água. Em caso de persistência de sintomas, dê entrada nas Urgências em Santa Maria. [P.M.]

Tchick tchick

Os soldadinhos eram metralhados de alto a baixo, pela lógica estariam mais que mortos. Mas nós fazíamos o gesto de quem desinfecta uma ferida com algodão e dizíamos: «Tchick tchick, tás curado». [P.M.]

Fantoches

Contribuo com pano para os fantoches com a minha cara. [P.M.]

Nem assim

A misantropia, infelizmente, requer alguns dotes sociais. [P.M.]

Mandarim

Há sempre um momento em que começam a conversar em mandarim. Não é de propósito: tiveram aulas de mandarim e consideram normal conversar nesse idioma. Eu não.

Não me pretendem vexar, eu sei que não. Que isso na prática aconteça, é apenas um dano colateral. [P.M.]

7/21/2005

Grupos

Não percebia porque é que «grupos» significa «tangas» (ex: eu não papo grupos = eu não vou em conversas).

Depois, estive metido nalguns grupos. E percebi. [P.M.]

Ligação segura

Sempre que consulto o meu mail em computador alheio, aparece a pergunta: se eu tenho uma ligação segura. Mas eu não comento assuntos íntimos. [P.M.]

Do mundo

Porque é que este blogue se chama Fora do Mundo? Porque não comenta a demissão do Ministro das Finanças. [P.M.]

7/20/2005

Opiniões

Um dizia que fomos demasiado severos com o estruturalismo. Outro dizia que a melhoria nas maminhas se deve ao iogurte Adágio. [P.M.]

Jack Straw

D. disse: «O Jack Straw está um bocado excitado». Eu estava um bocado excitado, mas achei estranho que D. mo censurasse desse modo, com ínvias metonímias. D. disse que eu não tinha percebido e apontou para a televisão. Na BBC, o Jack Straw estava um bocado excitado. [P.M.]

Obscuro domínio

Um post obscuro é um post que diz muito mas não revela nada. [P.M.]

Product placement 2

Convido vexas a cair verticalmente no vício (de forma), do nebuloso senhor Janeiro. [P.M.]

Charada

(para os exegetas)

O António Preto sempre que muda de casa fica logo a esquiar melhor.
O Gonçalo Borges sempre que compra uma mangueira fica logo a assobiar melhor.
O Rui Fonseca sempre que torçe um pé fica logo a tossir melhor.
O Miguel Esteves sempre que come santola fica logo a dançar melhor.
O Fernando Morais sempre que joga à macaca fica logo a foder melhor.

(etc)

[P.M.]

Product placement 1

Serendipity: (talent for) Making fortunate and unexpected discoveries by chance. Since July 20, 2004. [P.M.]

7/19/2005

O meu Hayek é maior que o teu

Alguns bloguistas direitistas, nomeadamente no Blasfémias, consideram estranho que eu participe num evento chamado «Noites Liberais» (numa sessão marcada para Setembro e dedicada à cultura). Insinuam sisuda ou ironicamente que eu não sou um liberal como eles são. Mas é claro que eu não sou um liberal. Sou em muitas matérias um aliado dos liberais, simpatizo com algumas posições liberais, mas nunca me considerei liberal. Escrevi isso tantas e tantas e tantas vezes em três anos de blogues que não vejo onde exista dúvida ou polémica.

Não me foi comunicado pela organização das «Noites Liberais» nenhum caderno de encargos: perguntaram se me interessava discutir determinado tema com um convidado que tenha ideias diferentes (no caso António Mega Ferreira). Só isso. Se me convidassem para representar os liberais, eu tinha recusado o convite, porque não sou liberal (e em matéria cultural ainda menos). E se me convidassem para representar os conservadores, também tinha dito que não, porque mesmo sendo conservador obviamente não represento ninguém. A mania de quererem que a gente represente uma posição, de preferência de modo ortodoxo e infalível.

Outra coisa será dizerem que o «liberal» das «Noites Liberais» não é realmente liberal. É uma discussão interessante. Acho que o «liberal» das «Noites Liberais» pretende apenas marcar uma cisão com a direita iliberal, atitude na qual me reconheço inteiramente. Admito que existam poucos liberais nas «Noites Liberais». Mas lembro que alguns dos nossos bloguistas ditos liberais - nem é o caso dos Blasfemos - têm o costume de louvar constantemente as opiniões ultramontanas em matéria de costumes.

Eu não tenho nada contra gente com contradições. Mas quem zela pela pureza das espécies deve ter cuidado com as suas próprias misturadas. [P.M.]

7/18/2005

Magic word

Não «Rosebud» mas «Innisfree». [P.M.]

Quando os animais falavam

Quoth the raven, «Nevermore». [P.M.]

O futuro da literatura (Charlie Brown speaks out)



Entre o que os adultos disseram, houve uma coisa que me chamou a atenção:

«Whuón fuon zong?»
«Nhenhe uezozi».
«Fenhizong fonfon, fonfon fenhizong?»
«Uófuónhuó».
«Fonfon».

[P.M.]

Situação limite

Um conhecido sacerdote declarou que só devemos usar o preservativo em situações limite. Concordo. Eu só uso o preservativo em situações muito limite. Que é como quem diz: quando tenho sexo. [P.M.]

7/17/2005

Top of the pops

Estive esta semana no programa de Nuno Galopim na Radar (passou ontem e repete logo às 22). Não recomendo que o ouçam para me ouvirem a mim, que só disse patacoadas. Mas o Nuno pediu-me para escolher cinco canções: 2 dos meus álbuns estrangeiros preferidos, 1 do meu álbum português preferido e 2 de álbuns estrangeiros recentes. São essas canções que justificam a sugestão: «Avalanche» (Leonard Cohen), «Unhappy Birthday» (The Smiths), «Barcelona» (Mão Morta), «Blood Embrace» (Bonnie Prince Billie/ Matt Sweeney) e «Modern Way» (Kaiser Chiefs). P.M.

7/13/2005

Nenhum leilão da Christie's

Tocar

-Did he touch you?
-No.
-Did you touch him?
-No.
-Did anybody touch anybody?
-Well…yes.

(sex, lies and videotape, Steven Soderbergh, 1989)

Minúsculas

Nunca percebi porque é que sex, lies and videotape não leva maiúsculas. [P.M.]

Conhecer uma pessoa

«Conheci uma pessoa». Eis uma expressão que nalguns casos implica dois evidentes exageros. [P.M.]

Jesus wants me for a sunbeam (4)

Não há muita gente tão obcecada com a Bíblia como Nick Cave. Sobretudo com o Antigo Testamento,violento e vingativo (mas também há um excelente texto de Cave sobre o Evangelho de São Marcos). É uma obsessão ambivalente, e com momentos distintos, do misticismo ao sarcasmo. Escolho, entre tantas canções com menções religiosas, esta perspectiva sobre o estado do mundo.

4. Nick Cave,«God is in the House», No More Shall We Part (2001)

We've laid the cables and the wires
We've split the wood and stoked
the fires
We've lit our town so there is n
Place for crime to hide

Our little church is painted white
And in the safety of the night
We all go quiet as a mouse
For the word is out
God is in the house
God is in the house
God is in the house
No cause for worry now
God is in the house

Moral sneaks in the White House
Computer geeks in the school house
Drug freaks in the crack house
We don't have that stuff here
We have a tiny little Force
But we need them of course
For the kittens in the trees
And at night we are on our knees
As quiet as a mouse
For God is in the house
God is in the house
God is in the house
And no one's left in doubt
God is in the house

Homos roaming the streets in packs
Queer bashers with tyre-jacks
Lesbian counter-attacks
That stuff is for the big cities
Our town is very pretty
We have a pretty little square
We have a woman for a mayor
Our policy is firm but fair
Now that God is in the house
God is in the house
God is in the house
Any day now He'll come out
God is in the house

Well-meaning little therapists
Goose-stepping twelve-stepping Tetotalitarianists
The tipsy, the reeling and the drop down pissed
We got no time for that stuff here
Zero crime and no fear
We've bred all our kittens white
So you can see them in the night
And at night we're on our knees
As quiet as a mouse
Since the word got out
From the North down to the South
For no-one's left in doubt
There's no fear about
If we all hold hands and very quietly shout
Hallelujah
God is in the house
God is in the house
Oh I wish He would come out
God is in the house


[P.M.]

Teologia moral

1 Coríntios 6, 16 é um bocadinho exagerado. [P.M.]

Quandoque bonus dormitat Homerus

Nunca percebi o alcance desta expressão elevada: Quandoque bonus dormitat Homerus («por vezes mesmo o bom Homero dormitava»). Que diabo, «dormitar» não é assim um lapso tão grave, sobretudo para uma pessoa que nem existiu (como Homero).

Ficava muito mais convencido com um (perdoem o macarrão) Quandoque sapientissimus putanitat Emmanuel («por vezes mesmo o sapientíssimo Kant ia às putas»). Isto sim anima um gajo em momentos de pecado. [P.M.]

Contra mim mesmo

Susan Sontag tem um ensaio sobre Cioran, o mais genial pessimista do século passado, com o título «Thinking Against Oneself». Sempre quis ser digno desse mote. Que me digam que tenho conseguido, eis um imenso elogio. [P.M.]

Companheiro amigo camarada palhaço

Um bloguista sem otites ouviu em local público um conhecido jornalista português (Marques António) desancar este vosso escriba. O conhecido jornalista português (Mendes Artur) dizia mais ou menos isto: «esse indivíduo que tem um enorme rancor contra si mesmo». É genial. Uma mui acertada definição, equivocada em ataque pessoal. Quero agradecer o perspicaz epíteto ao conhecido jornalista português (Novais João). Da próxima vez que nos virmos pago uma rodada de Famous Grouse. [P.M.]

7/12/2005

Arte de discutir na blogosfera

Num dos melhores blogues do mundo e arredores.
[comentário enquadrável em «sociedade de admiração mútua», segundo o ponto 11] [P.M.]

7/11/2005

Espírito Santo



Ao procurar no Google a foto que ilustra o post anterior, descobri esta, que não conhecia. Como vemos, Suzanne foi ungida pelo Espírito Santo. Assim também eu. [P.M.]

Linguagem

Se gosto muitíssimo de Suzanne Vega (n. 11.7.1959) é em parte pelo seu espantoso trabalho com a linguagem. Não se trata apenas de uma letrista competente: cada texto de Vega é construído com absoluta minúcia, como se fosse uma pirâmide de fósforos (a imagem é dela). Nada está a mais nem a menos, como se o poema tivesse sido lido trezentas vezes em voz alta antes de passar ao papel.

Ao mesmo tempo, Vega sabe (como pouca gente no universo pop) que a linguagem é uma coisa que nos escapa, que a linguagem não é uma evidência mas quando muito uma aposta (e uma aposta geralmente sem esperança).




É isso que diz em «Language», de Solitude Standing (1987):

I won't use words again
They don't mean what I meant
They don't say what I said
They're just the crust of the meaning
With realms underneath
Never touched
Never stirred
Never even moved through.

[P.M.]

De um mail

Ouve lá, ó palerma, então eu só vou ao teu blog para ver as gajas (não tenho cu para a conversa) e tu vais e espetas dois barbudos em menos de uma semana? Ora fosgasse. [P.M.]

Referee



«Marina quê? Politólogos burgueses, é o que é». [P.M.]

Desmancha-prazeres

O que sabemos do comportamento eleitoral dos portugueses é que, ao contrário do que poderíamos pensar, as características socio-económicas não são bons indicadores: nem o rendimento, nem a educação são variáveis que expliquem o voto. Há pessoas com fracos rendimentos a votar à direita, pessoas com muitos rendimentos a votar à esquerda, pessoas com escassa instrução a votar tanto à esquerda como à direita. Portanto, os grupos sociais que se dividem entre esquerda e direita são relativamente semelhantes.

Marina Costa Lobo, politóloga, no DN de hoje. [P.M.]

Srebrenica

Srebrenica, o maior massacre em território europeu desde 1945, foi há dez anos. Deixou talvez 8000 mortos (muitos ainda por identificar). Sabemos que não foi um acidente. Não foram inopinadas vítimas civis de um ataque militar. Srebrenica foi uma «operação de limpeza», deliberada e planeada. E quase todas as discussões políticas que importam passam por Srebrenica: não apenas a NATO, as Nações Unidas, a União Europeia, mas também o «choque de civilizações», o nacionalismo, a natureza da espécie humana. [P.M.]

Raiz quadrada de menos um

Na introdução (muito emproada e indigesta) a New Poems (1938), e.e. cummings tem este arrancanço de nietzschianismo estético armado ao pingarelho que acho magnífico: The poems to come are for you and for me and are not for mostpeople - it's no use trying to pretend that mostpeople and ourselves are alike. Mostpeople have less in common with ourselves than the squarerootofminusone. [P.M.]

Imagem

Vivemos na época da imagem? Com certeza. Mas não apenas da imagem impressa, televisiva ou cibernética. Vivemos também de acordo com a imagem que os outros têm de nós. Melhor: com a imagem que os outros fazem de nós. Foi sempre assim? Claro. Mas nunca como hoje as pessoas se presumiram ingenuamente «sem preconceitos». Quando os preconceitos continuam vivíssimos. [P.M.]

Abominável Homem das Neves

À segunda frase saca do mace. Diz que me reconheceu pelas pegadas. [P.M.]

7/10/2005

Delete



Connections are ‘virtual relations’. Unlike old-fashioned relationships (not to mention ‘comited’ relationships, let alone long-term commitments), they seem to be made to the measure of a liquid modern life setting where ‘romantic possibilities’ (and not only ‘romantic’ ones) are supposed and hoped to come and go with even greater speed and in never thinning crowds, stampeding each other off the stage and out-shouting each other with promises ‘to be more satisfying and fulfilling’. Unlike ‘real relationships’, ‘virtual relationships’ are easy to enter and to exit. They look smart and clean, feel easy to use and user-friendly, when compared with the heavy, slow-moving, inert messy ‘real stuff’. A twenty-eight year-old man from Bath, interviewed in connection with the rapidly growing popularity of computer dating at the expense of single bars and lonely-heart columns, pointed to one decisive advantage of electronic relation: ‘you can always press «delete»’


Zygmunt Bauman, «Introdução» a Liquid Love: On the Frailty of Human Bonds, Cambridge, Polity Press, 2003 [P.M.]

Horácio

Nos sites de engate, a frase que as meninas mais citam é o clássico carpe diem (que conhecem via Clube dos Poetas Mortos).

Eu cito Rubem Fonseca: «Carpe diem? Horácio que se foda». [P.M.]

Dating: a reader's guide

Dan Brown, O Código Da Vinci
Isabel Allende, A Casa dos Espíritos
Luis Sepulveda, O Velho que Lia Romances de Amor
Margarida Rebelo Pinto, Sei Lá
Marion Zimmer Bradley, As Brumas de Avalon
Miguel Sousa Tavares, Equador
Nicholas Sparks, As Palavras que Nunca te Direi
Patrick Suskind, O Perfume
Paulo Coelho, O Alquimista
Suzana Tamaro, Vai Onde te Leva o Coração

[P.M.]

Hi5

«24 anos. Morena. Olhos verdes. Gosto de sair à noite. De ouvir música. De ir à praia. De estar com os amigos. Curto Thomas Bernhard». [P.M.]

Guardar

CHICO: What you need is a good bodyguard.

GROUCHO: What I need is a good body. The one I've got isn't worth guarding.

(A Night in Casablanca, 1946). [P.M.]

7/09/2005

Onde está a tua vitória

Onde está, ó morte, a tua vitória? Onde está, ó morte, o teu aguilhão?
(1 Coríntios 15:55)



Estive sem net nos últimos dois dias e por isso não escrevi sobre o ataque a Londres. Mas soube que muitos blogues responderam a esta tragédia com imagens e poemas. E pensei em Don DeLillo.

Quando li pela primeira vez DeLillo entendi o seu tom de paranóia (tributário de Pynchon) mas não percebi a sua obsessão com o terrorismo (por exemplo em Mao II, 1991). O terrorismo não me parecia assim tão central na nossa existência.

Infelizmente, o infame 11 de Setembro mostrou como o terrorismo é uma ameaça permanente, demencial e imponderável.

Mas o terrorismo é também um desafio à nossa capacidade de resistência. Ao ver nos blogues os poemas e as imagens (do blitz de 1940, nomeadamente), lembrei-me do ensaio «In the Ruins of the Future», que DeLillo publicou na Harper's (e depois no Guardian) em Dezembro de 2001.

É um texto extensíssimo que vale a pena ler na íntegra. De repente, aquilo que parecia paranóia ou apenas literatura estava em todos os canais de TV.

DeLillo explica que o terror é uma narrativa, uma narrativa apocalíptica a que não escapamos: Terror's response is a narrative that has been developing over years, only now becoming inescapable. It is our lives and minds that are occupied now. This catastrophic event changes the way we think and act, moment to moment, week to week, for unknown weeks and months to come, and steely years. Our world, parts of our world, have crumbled into theirs, which means we are living in a place of danger and rage. (...) We can tell ourselves that whatever we've done to inspire bitterness, distrust and rancour, it was not so damnable as to bring this day down on our heads. But there is no logic in apocalypse.

Contra essa narrativa, possuímos apenas uma contra-narrativa: a nossa memória dos mortos mas também a memória dos sobreviventes: There are 100,000 stories crisscrossing New York, Washington, and the world. Where we were, who we know, what we've seen or heard. There are the doctors' appointments that saved lives, the cellphones that were used to report the hijackings. Stories generating others and people running north out of the rumbling smoke and ash. Men running in suits and ties, women who'd lost their shoes, cops running from the skydive of all that towering steel. People running for their lives are part of the story that is left to us. There are stories of heroism and encounters with dread. There are stories that carry around their edges the luminous ring of coincidence, fate, or premonition. They take us beyond the hard numbers of dead and missing and give us a glimpse of elevated being. For 100 who are arbitrarily dead, we need to find one person saved by a flash of forewarning. There are configurations that chill and awe us both.

Como no poema de Holderlin, o que nos destrói é também o que nos salva. E por isso não devemos esquecer nada: The cellphones, the lost shoes, the handkerchiefs mashed in the faces of running men and women. The box cutters and credit cards. The paper that came streaming out of the towers and drifted across the river to Brooklyn backyards, status reports, résumés, insurance forms. Sheets of paper driven into concrete, according to witnesses. Paper slicing into truck tyres, fixed there. These are among the smaller objects and more marginal stories in the sifted ruins of the day. We need them, even the common tools of the terrorists, to set against the massive spectacle that continues to seem unmanageable, too powerful a thing to set into our frame of practised response.

O combate ao terrorismo exige decisões políticas decisivas e decididas.

Mas nós, cidadãos comuns, temos isto ao nosso alcance: poemas e imagens e narrativas. Que nos assegurem uma vez mais que a morte não prevalece. [P.M.]